Hoje não fui à escola pela 17ª vez este ano. Terei eu chumbado por faltas?
Longe do medo e da descrininação refugio-me em casa e encolho-me como uma tartaruga assustada por não compreender porque serei assim...
Todos os meus amigos têm uma namorada, todos um dia se irão casar, ter filhos, amigos, uma vida perfeita... e eu aqui estou, uma alma penada solta num universo que me rejeita a cada segundo que passa.
Que mal fiz eu para gostar de alguém do meu género? Que mal fiz eu para nascer com este defeito de gostar de um homem ao invés de amar uma mulher? Serei anormal? Uma aberração da natureza? Um pedaço de algo vazio nest mundo ao qual tanto gostaria de pertencer?
Que mal tem eu beijar um homem? Deus não diz 'Ama o próximo'? Eu amo-o mas isso custou-me a perda de todos os meus amigos. Agora aqui estou refundido num espaço que é só meu e onde ninguém pode penetrar... o que me agride bastante psicologicamente já que eu também não posso penetrar no mundo de ninguém. E isso é um ataque psicologico à minha inteligencia, às minhas disfunções sexuais.
Mas no entanto eu sei que somo como tu, tenho 2 braços, 2 pernas, 2 olhos e 1 coração; tenho sentimentos, sei correr, saltar, estudar, gosto de sair com os meus pais, só que infelizmente nutro por ti o mesmo carinho que tu nutres pela tua companheira.
Que mal tem isso? Que culpa tenho de saber amar?
Mas o pior é o meu amigo Pedro. Esse então foi completamente despojado desta realidade. Esse nem consigo compreender como ainda está agarrado à vida.
O coitado um dia também amou uma mulher e decidiu fazer amor com ela. Pena não ter usado métodos contraceptivos e agora está agarrado ao tempo.
Já todos sabem que é portador do vírus HIV, já todos sabem que é tudo uma questão de tempo, todo o mundo sabe que a sida pega-se apenas através do sangue mas ninguém é capaz de lhe tocar, ninguém é capaz de lhe dar um abraço. E ele ali fica, sentado num canto, a olhar para as paredes, a riscar dias num calendário, horas na sua cabeça, à espera que a sua hora chegue.
Hoje é apenas um pedaço de carne viva que vagueia por este mundo ilusório onde não passamos todos de simples truques de magia.
Que culpa tem ele de um dia ter decidido fazer amor?
Mas triste mesmo foi o que aconteceu ao Rui. O coitado nasceu de uma junção de dois seres de raça africana. Dois seres como eu e tu. Mas no entanto os genes hoje em dia são imperfeitos e ele nasceu com uma cor diferente da minha. Infelizmente ele nasceu preto como um cão, como um animal desprezível. Eu sempre pensei que a cor não interessava e que apenas o que está para lá da cor tivesse algum significado. Mas depois do que aconteceu com ele tive de mudar o meu ponto de vista. Ele apaixonou-se por uma rapariga e tentou chegar perto dela. Infelizmente era namorada de um tal riKKKardo e isso custou-lhe a vida. Foi espancado até à morte por ser um forasteiro indesejado neste espaço tão pequeno mas onde todos deveriamos caber caso se partilhassem ideias e culturas sem se pensar na negativa. O Rui só quis amar, só quis ter um amigo, uma mulher, uma vida... Mas hoje em dia sou forçado a odiar pretos porque são 'restos da sociedade' e eu não posso pactuar com eles. Se existem, têm de ser abatidos.
Mas que mal fez ele? Que culpa tinha ele da cor com que nasceu? Pensei que fossemos todos iguais mas infelizmente a cor constroi uma personalidade e neste mundo quando uma pessoa é de cor diferente é porque não merece dar-se com gente como eu e tu...
Ah... já me esquecia do João. Nem devia falar nisto porque é tabu mas apeteceu... O João já andava com a Inês há coisa de 6 anos. Mas só então notou algo de estranho nela. A Inês já não era a mesma, tinha novos amigos, frequentava clubes bastante discretos e andava com umas atitudes meio estranhas. Foi então que descobriu que a Inês tinha experimentado o 'fruto proibido' e que agora só queria comê-lo sempre à sobremesa. O João tentou afastá-la dessa realidade mas só teve conflitos que não resultaram em nada. A Inês quase que não lhe dava atenção e não queria sair desse mundo por nada mesmo. Então o João só teve uma opção: entrar para lá e tentar arrastá-la de lá para fora. Mas infelizmente tudo foi abaixo. O João gostou da sensação e ficou lá preso. Hoje em dia deixou de se dar com os amigos, deixou de se dar comigo mas eu continuo a ser amigo dele porque ele 'estaciona-me' o carro sempre que vou ao hospital. Tudo bem que ele não se lembra de mim (nem compreendo porquê) mas eu sei que no fundo sabe que me conhece de algum lado porque me estende a mão sempre que lhe dou 50 cent pela sua boa acção. Tenho saudades dele mas ele preferiu dar-se com outro pessoal.
Que mal lhe fiz eu? Que mal fez ele à Inês?
Enfim... este é o Mundo em que vivemos. Onde não se aprende a amar porque se perde demasiado tempo a odiar, a desprezar, a matar, a exterminar.
Mas depois dizemos que a culpa foi do Hitler e que hoje é do Bush, dizemos que são os nazis e os fascistas os culpados desta merda, que se não fossem os ucranianos isto andava tudo sobre rodas.
Mas na verdade quem mata e destroi sou EU e és TU! Somos nós que construimos aqui para destruir ali. Somos nós que nos deixamos levar pelo capitalismo e pelas suas subtilezas ganancioas de querer ter sempre mais que o vizinho para que ele olhe para o meu carro enquanto eu cuspo no dele.
Sou EU que te roubo o que tens para investir no que quero e um dia dizer que foi tudo fruto do meu sucesso, sou EU que construo o fascismo, sou EU que desprezo os ucranianos, não é ELE... sou EU e és TU!
Como poderei eu dizer que vivo num regime livre de expressão quando tenho nojo de um portador do virus HIV ou de um ser de outra raça? Não posso.
APRENDE A AMAR E SÓ DEPOIS A ODIAR!