Tuesday, July 26, 2005

FOR THE GLORY - entrevista

...de shows de 50 pessoas para palcos de 500...



FOR THE GLORY é mais um daqueles ‘exemplos’ de sucesso no movimento hardcore nacional. Depois do ‘desaparecimento’ de bandas como X-ACTO, RENEWAL, TIME X, AS GOOD AS DEAD, etc, o movimento foi um pouco abaixo mas sem morrer por completo. Mas como tudo o que nasce morre… tudo o que parece morrer acaba por renascer… E foi assim que começaram a surgir bandas como 20 Inch Burial, For The Glory, Black Sunrise, etc. Bandas cuja mensagem continua bastante firme na base do que o hardcore é e deveria ser.
Deste lote de bandas temos os FOR THE GLORY. Após o lançamento de ‘Drown in Blood’, a ligação à Raging Planet e uma agenda de concertos, que não só percorreu o país de Norte a Sul como os levou a correr a Europa de uma ponta a outra, eis que regressam a Faro para deixar marcas partilhando o palco com os SYNEAD, R.J.A. e CLEAN SPIRIT. Há que referir também que FOR THE GLORY foi a banda até hoje que mais gente ‘levou’ à Associação de Músicos de Faro em concertos dados no ‘palco pequeno’. Aqui ficam as 10 impressões digitais que tirei ao vocalista Congas às 3h30 da manhã do dia 25 de Julho de 2005.




1- Congas, desenha lá um pouco o percurso dos FOR THE GLORY nestes últimos tempos tendo em conta as constantes mudanças de formação, agora que aparecem com o Rui de 20 Inch e reaparecem com o Miguel que já tinha feito parte do projecto.

Ora bem, então o que se passa é o seguinte. Os FTG começaram há cerca de 2 anos, demos o nosso primeiro concerto a 31 de Agosto em Lisboa. Nessa altura a banda era formada por mim, Rui, Sérgio, Mike e Poli. Fizemos umas tours e tal, duas europeias, lançamos o disco, promovemos de norte a sul e tal e depois de estarmos assim a preparar as cenas novas é que o Miguel e o Poli decidiram que se calhar não era o que eles queriam. Tivemos então o João de Criminal Waste a tocar connosco mas que não resultou e ele acabou por sair da banda à pouco tempo. Como tínhamos uma data de shows marcados e não tínhamos baterista para fazer esses mesmos shows falamos com o Miguel e ele juntou-se a nós para nos fazer estas datas e temo-nos divertido bastante.
O Ricardo de 20ib foi daquelas ajudas brutais. Este ano em Janeiro nós fomos em tour e o Sérgio não pôde ir, falamos com o Ricardo e ele prestou-se em ajudar o pessoal e veio connosco fazer a segunda guitarra. Quando o Poli saiu da banda o Ricardo continuou a ajudar a banda e sempre que podemos contar com ele, toca com a malta e tal. É brutal poder tocar com ele porque ele traz uma grande energia à banda e bons riffs e ideias. Mas ele e o Miguel estão apenas a ajudar enquanto não temos pessoal para ficar a tocar com a banda, mas nunca se sabe…



2- Agora falando um pouco mais de ti... TIME X, WHAT WENT WRONG, FOR THE GLORY... que mais? Descreve lá aqui um pouco o teu percurso.

Eu comecei com bandas aos 12 anos. Tinha uma banda aqui na zona que eram os SEM ABRIGO (punk fodido), eheheh. Depois fiz os DOUBLE SCANDAL e daí em diante percorri os POSITIVE WAY, BY MY SIDE, TIME X, SEIZE THE DAY, DAY OF THE DEAD, THE FIENDS, WHAT WENT WRONG, FOR THE GLORY…
Mano, eu cresci com o hardcore, sempre me identifiquei com as cenas, ideias, musica, atitude íntegra e sincera… Nunca fui muito de merdas de vedetismos. Sempre toquei mal e cantei mal mas sempre quis seguir o meu sonho que era ter bandas e fazer tours, cenas assim.
Tipo, já vi de tudo na cena hardcore, muitas bandas que levantei e muitas bandeiras que deixei de erguer, chateei muita pessoa e deixei muita pessoa feliz, disse merda e disse coisas boas. Não sou um santo mas também não sou um demónio.
Sei que por vezes há ainda o pensamento que tenho manias, que sou vedeta e não sei, não quero de forma alguma estar a desculpar-me ou a apresentar alguma merda a meu favor mas sei o que faço e tenho noção das merdas que faço mas também tenho noção que sou assim mesmo, o que vês é o que tens. Não gosto de falinhas mansas para agradar.
Acho que o que falta na cena hardcore é as pessoas cortarem as merdas e serem objectivas sem grandes rodeios e mostrarem o seu impacto no mundo à volta delas, marcarem a sua posição independentemente do que defendem Uma coisa que sei fazer é aceitar a diferença; aceitar a diferença e individualidade de cada um é um passo importante na vida das pessoas e no sangue corrente da cena hardcore, para que cresçamos como pessoas e bem com o Mundo.
Aprendi a aceitar as pessoas e a lutar pelo que gosto mas uma coisa é verdade: tenho cara de mau, ahahaha.



3- Pois é... infelizmente o hardcore de 2005 não é o mesmo de 1995. As pessoas mudaram e as mentalidades não ficaram atrás… Antes havia mais aquele feeling de entreajuda, hoje há mais as celebres 'facadas nas costas' para subirem enquanto os outros desaparecem. Como vês a cena hardcore actual comparada com a de há 10 anos atrás?

Mano, eu concordo plenamente que a cena não é a mesma de 96 mas ainda bem se queres que te diga. Tenho pena que os shows estejam cada vez mais vazios mas por outro lado compreendo que agora as coisas estão mais abertas, há mais por onde escolher. As facadinhas sempre existiram e sempre hão-de existir. Isto é uma cena hardcore que vive sobre isso, senão onde iriam os youth of todays e as bandas youth crew fazer letras? Ahahaha. Faz parte da cena viveres e conviveres com pessoas que até não gostas muito, mas é como disse, vive com as diferenças e mantém-te no teu caminho. Uma batalha ganha pelo teu suor sabe bem melhor do que ganha de forma suja. Agora há mais bandas e mais qualidade, acho, não temos salas boas para concertos e é difícil fazer shows, mas mesmo assim não impede de haver shows a toda a altura. Cada vez mais bandas de fora vêem cá e isso é grande power.



4- Permite-me que discorde parcialmente do teu ponto de vista. Eu penso que actualmente temos mais salas e condições para tocar mas as bandas cada vez têm menos qualidade; há cada vez menos adesão nos concertos. Mas penso que o tocar ao vivo não é o mais importante, pelo menos no hardcore. O + importante não seria mesmo a mensagem? Mas com tanta 'facada' torna-se difícil, não achas?

De que adianta a mensagem se a passas ao teu núcleo de amigos que sabe das coisas? De que interessa não teres meio de suporte para fazeres a mensagem? Epá, eu acredito que a mensagem é super-importante, é isso que faz com que o hardcore seja tão verdadeiro, é as pessoas serem verdadeiras com a sua cena. Mas também o hardcore prima por ser uma cena de musica onde as pessoas são normais, sem grandes rodeios, todos podemos ter uma banda, tocar uma musica, divertirmo-nos com os nossos amigos… Não estou a dizer de forma alguma que hardcore é apenas musica, porque não é, mas de certeza forma é um estilo musical com umas ideias baseadas numa vida simples, pessoa, opiniões verdadeiros e relatos da tia vida pessoal / social e é o facto em como letras simples conseguem tocar nos corações de pessoas e fazê-las pensarem e despertar reacções. Isso é hardcore, na minha opinião.



5- Agora mudando um pouco de assunto e tocando num tema que bastante me custa pronunciar. Mas, se dizes que o hardcore é tão verdadeiro e que pode tocar nos corações das pessoas como explicas que uma pessoa como o Rodrigo, um dos impulsionadores da vertente straight edge e do positivismo em Portugal, possa ter tido o fim que teve?

O Rodrigo tocou numa das bandas que mais respeito em Portugal e que mudou a minha vida, X-ACTO. Pá, tipo, são coisas que nunca podem ser explicadas. Tu nunca sabes quando é que a tua vida pode deixar de fazer sentido, se calhar para ele achou que não valia a pena viver e decidiu pôr termo a isso. Há certas coisas que nunca serão compreendidas sem serem vividas na pele. Tenho muita pena que tenha sido assim mas espero que ele descanse em paz, não por ser chegado a ele (porque não o era) mas sim pela inspiração que foi para mim assim como para muito pessoal da cena hardcore straight-edge.



6- Sim, mas, voltando ao ponto fulcral da questão; dizes que o hardcore é uma cena forte, séria e sincera, mas não achas bizarro um seguidor da filosofia straight edge acabar com a vida desta forma?

O Rodrigo não era straight-edge desde o fim de X-ACTO.
Pá, eu sou straight-edge e já várias vezes pensei em pôr termo à vida; há certas coisas que nem mesmo o gajo mais positivo do mundo deixa de sentir…
Há momentos em que o mundo cai-te aos pés e tu nada podes fazer, parece que estás num buraco e acredita que não é o X na tua mão que te salva. Eu disse em Viana do Castelo assim: ‘O mundo não é azul mas também não é preto, é cinzento e temos de tirar o melhor proveito da vida’.

Ok, mas... o straight edge não era suposto ser para toda a vida? Uma pessoa 'deixar de o ser' é um pouco estranho. A música pode ser algo forte para te agarrares e para te suicidares nela... e não para acabar com ela cá fora…

O straight-edge é suposto ser até onde queres que ele seja, até ele fazer sentido… Assim como toda a vida é assente em pilares que só fazem sentido quando tu os vives da maneira certa e não os forças. De que adianta seres straight-edge se não sentes as cenas? De que adianta seres vegetariano se passas a vida a lamentar que queres carne? Tudo faz sentido na vida enquanto for verdadeiro, porque a partir do momento que está a ser feito por favor não é sincero, é como se fosse uma traição à tua própria pessoa. E tu deves de agradar a ti mesmo para que vivas de consciência tranquila.



7- Concordo plenamente. Agora deixando o Rodrigo de parte (paz à sua alma) e mudando um pouco de assunto, voltando ao movimento hardcore em Portugal. Onde estão os grandes concertos para 400 pessoas (com NEW WINDS, X-ACTO, TIME X)? Onde estão as zines? Onde está o sacrifício pela cena? Parece que actualmente as bandas sentem-se melhor num cartaz europeu ou americano do que a tocar por cá...

Pá, é assim… FOR THE GLORY toca concertos grandes às vezes, tocamos em festivais e cenas assim, tocamos para 100 pessoas como tocamos para 400 ou 500. Pá, para nós o importante é estarmos a tocar para quem nos quer ouvir e quem quer sair de lá com alguma coisa nova. Eu sempre fiz zines, labels, distros e bandas… Agora só tenho a banda, a minha vida não dá para mais. Mas sinto saudades das zines. De facto, eu falo por FTG, nós sentimo-nos bem a tocar na realidade hardcore europeia, temos muitas bandas amigas e temos tido facilidade em marcar tours e tocar lá fora. Se queres que te diga, em Portugal não se dá o devido valor ao que se faz por cá e isso afasta as bandas de quererem tocar cá. Por exemplo, tocar em Lisboa é muito mau de momento. Uma apatia geral tomou a cena de assalto, pode ser que mude…



8 - E a que achas que se deve essa apatia?

Há uns anos atrás as cenas estavam todas juntas, porque só havia um tipo de bandas. Todas as pessoas iam aos mesmos concertos. Agora tens mil bandas, vários estilos e cada um desses estilos tem 50 seguidores que acabam por ir só aos shows desse estilo, o que por sua vez faz com que os shows dos outros percam 50 pessoas. Imagina isto por várias vertentes da cena hardcore. E também em Lisboa pensa-se muito que se tem o rei na barriga e que já se viu muita coisa, quando afinal a cena tem muito para crescer em tudo.



9 - Yah... e infelizmente já se está a tornar mais uma moda do que outra coisa qualquer... Antes era o old school porque andava aí o boom de BETTER THAN A 1000 e BATTERY, etc... Às tantas foi o new york de MADBALL e AGNOSTIC, depois vieram as metaladas com a febre dos INDECISION e EARTH CRISIS. Agora anda muito 'emo' por aí ou então aqueles rasgos mais à DILLINGER. Afinal, para ti, o que é o hardcore hoje em dia?

São as pessoas, a individualidade, a forma como te apresentas no teu dia-a-dia, a vontade de entrar na vida a ganhar e de sair de cabeça erguida, quebrar as barreiras e os preconceitos, a energia, o mosh, a música, o stage dive, o mundo podre à minha volta, são tantas coisas…



10 - Para terminar... como disseste a pouco, cada vez mais há bandas estrangeiras a tocar por cá e cada vez mais temos bandas nacionais a ir lá fora... Mas cada vez menos vemos intercâmbio entre bandas nacionais; é raro veres 1 banda de Faro ir a Lisboa ou 1 banda da Guarda ir a Évora, por exemplo... O que sentes que falta no meio disto tudo para impulsionar mais as bandas que não têm tanta iniciativa para se mexer?

Epá, tipo, FTG não se pode queixar muito porque vamos a todo o lado, desde Viana até Faro, Europa toda e etc. Eu evjo bué de bandas portuguesas a ir lá fora pá. BLACK SUNRISE, NEW WINDS, DAY OF THE DEAD, POINTING FINGER, OMITED GR, pá, cada vez há mais bandas de Portugal a ir lá for a. E começo a ver os europeus/americanos a despertarem o interesse pelo que se faz por cá. De qualquer das maneiras cá em Portugal é um meio pequeno e não tem condições para ter tanta banda e tanto concerto ao mesmo tempo, isso leva à saturação. Eu acho que mesmo assim tens grandes bandas em Portugal e tens pessoal que se dá bem uns com os outros, não se pode esperar que haja boa interacção entre toda a gente mas pelo menos no que me toca a mim, e é sobre mim que falo, acho que tocamos com várias bandas e vários estilos desde que haja boa onda nos shows.
O que sinto falta?
Salas que não discriminem as bandas por tocarem uma cena mais agressiva, sinto falta do apoio às bandas underground, sinto falta de uma sala no coração de Lisboa que seja tão boa como o RITZ CLUB para se dar shows.
Acho que é disso que sinto falta.
E como são 3h30 da manhã sinto falta de pão quente e manteiga e tal e ir para a cama, ahahaha.


Obrigado pela humildade e sinceridade Congas, felicidades para a banda.

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